Entrevista sobre A garota do penhasco
1. A garota do penhasco é um romance muito complexo, com vários elementos distintos. Quanto tempo levou para ele ser escrito?
Eu percebi que, da concepção ao parto, todos os livros levam nove meses para “nascer”, igualzinho a uma gestação. É estranho, mas é verdade.
2. Onde você foi buscar inspiração para este livro?
É sempre um lugar inspirador que dá início à “sensação”. Eu nasci na Irlanda, morei em West Cork e amava aquela paisagem varrida pelo vento. Os lugares extremos sempre me empolgam por serem dramáticos e românticos. Pensar numa criança vulnerável, descalça e sozinha durante as tempestades do Atlântico que costumavam irromper com tanta fúria quando eu morava lá com meus filhos pequenos me deu a ideia da personagem de Aurora, a narradora do livro.
3. A jovem Aurora Lisle é uma personagem muito interessante e fora do comum. Ela foi inspirada em alguém que você conhece?
Aurora é uma personagem muito especial para mim. Queria que ela fosse etérea, quase onírica, porque o livro explora e brinca com a ideia de “conto de fadas”, que sustenta a maior parte das ficções românticas. Mas Aurora é também muito prática, sábia, e sabe perdoar – ela compreende quanto a vida é preciosa. Acho que ela representa dois dos temas-chave de todos os meus livros: entender e perdoar os erros do passado, e aproveitar cada dia e vivê-lo ao máximo. Embora eu nunca tenha baseado um personagem por completo numa pessoa real, sem dúvida Aurora tem mais de mim do que qualquer outra personagem que eu tenha criado.
4. O leitor nunca tem certeza se Aurora viu alguma coisa no penhasco ou não. Você acredita em fantasmas?
Não sei bem se eu os chamaria de “fantasmas”, pois eles me remetem a lençóis brancos flutuantes fazendo barulhos estranhos! Mas, sim, eu acredito totalmente em “espíritos” e “anjos” – inclusive já tive a sorte de vê-los. Quando os vi, foi bem diferente do “clarão ofuscante” que todo mundo parece descrever: eles passaram horas ali antes de eu identificar o que eram aquelas “formas brancas”! Parece ridículo, eu sei, porém é verdade. Como diz Aurora, não há prova a favor nem contra. A nota do dólar americano traz escrito “In God We Trust” (“em Deus nós confiamos”) mas, que eu saiba, ninguém nunca conseguiu tirar uma foto de Deus ou entrevistá-lo! Para ser sincera, não sou muito chegada à religião organizada, apenas acredito num poder maior do que nós, humanos, e tenho humildade suficiente para perceber que existe muita coisa que nunca conseguiremos entender. Quem/que energia criou o Big Bang, para começar? Ninguém sabe.
5. Como as situações contemporâneas e históricas se sobrepõem no seu livro?
A eterna conexão entre passado e presente me fascina. Sempre existe algo que podemos aprender com as experiências de nossos ancestrais. Compreender o que aconteceu antes muitas vezes pode nos ajudar a entender nossas vidas atuais.
6. Em todos os seus livros, casas e propriedades têm papel preponderante e interligam pessoas e gerações. Por quê?
Talvez porque eu acredite que, em momentos conturbados, todos nós ansiamos por voltar para a casa da nossa infância, onde quer que ela se encontre. Esse é um lugar de segurança e um lembrete de onde nós viemos. Também adoro casas e prédios antigos porque eles contêm muitas histórias e segredos a serem explorados.
7. Sua heroína, Grania Ryan, é a encarnação da honestidade, do orgulho e dos princípios morais. Ela é uma generalização dos irlandeses? Por que essas pessoas são tão raras?
Eu sou irlandesa e passei minha infância na Irlanda, e é verdade que as mulheres de lá são incrivelmente fortes e cheias de princípios. Elas também tendem a dizer o que pensam, e não aturam muito gente boba! Tenho imensa admiração por elas. Na verdade, não acho que mulheres como Grania sejam tão raras assim – gosto de acreditar que a maior parte das pessoas tem o desejo de “fazer a coisa certa” se tiver a oportunidade.
8. Você já foi atriz, mas este livro traz o tema do balé clássico. Você gosta de balé?
Sim, sou ex-atriz, mas antes disso fiz formação de bailarina dos 3 aos 16 anos. Então, sim, eu adoro balé e, se não tivesse sofrido uma grave lesão no joelho aos 17 anos, provavelmente ainda estaria dançando.
9. No livro, você aborda a relação entre irlandeses e ingleses. Isso parece enfatizar a superioridade dos ingleses. Sempre foi assim?
O histórico da relação entre Inglaterra e Irlanda é extenso, turbulento e amargo. Tudo começou no século XVI, quando o rei inglês Henrique VIII tentou colocar a Irlanda sob o controle do governo da Inglaterra, uma disputa que perdurou durante os reinados de Elizabeth I e Jaime I. No final do século XVIII, os ingleses já haviam confiscado a maioria das terras dos antigos proprietários irlandeses católicos. Quando veio a Primeira Guerra Mundial – época em que parte do romance é ambientada – perturbações ligadas à independência da Irlanda já eram claramente visíveis. O país estava dividido: o “norte”, que permaneceu sob controle britânico por escolha própria; e o “sul”, que se tornou independente na década de 1920, acarretando novos conflitos com a Inglaterra nas décadas subsequentes. Dessa forma, é inevitável que todo esse histórico faça parte do contexto de A garota do penhasco.
10. Como os seus leitores reagiram a A garota do penhasco?
A reação até agora me deixou completamente impressionada. A garota do penhasco foi lançado em 2011 no Reino Unido e chegou ao primeiro lugar das listas tanto da Alemanha quanto da Noruega, além de entrar direto na lista de mais vendidos do The New York Times, nos Estados Unidos.
Recebo centenas de e-mails e mensagens de Facebook de mulheres (e alguns homens) com idades que vão de 20 a 80 anos. Acho que o livro agrada qualquer um que goste do que espero ser uma história bem escrita, com um código moral embutido. Meus livros não são para os cínicos, que acreditam que o mundo é um lugar “ruim”. Como diz Aurora, acredito que a raça humana é intrinsecamente “boa”, e que a redenção e algum nível de perdão são sempre uma possibilidade. E essa é a base que sustenta o desenvolvimento das minhas histórias e personagens.